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  • Foto do escritorDra Daiana S. Takeshita

Cláusulas de não concorrência sob a mira do Judiciário

Publicado via Consultor Jurídico



As cláusulas de não concorrência comumente previstas nos contratos de franquia empresarial têm por objetivo resguardar o “know-how” dos franqueadores composto na maioria dos casos pelo desenvolvimento e compartilhamento de métodos, conhecimentos de gestão empresarial e técnicas específicas empregados no negócio da franquia que traduzem os segredos do negócio da franquia e que em tese são transferidos aos franqueados através de suporte e treinamento.


Nada mais justo, afinal, pois ideias executadas com excelência e transformadas em modelo de negócio promissor devem conferir ao seu executor o merecido crédito e monetização.


Neste sentido, as cláusulas de não concorrência têm por objetivo impedir que franqueados venham a fazer uso dos segredos do negócio do negócio do franqueador aos quais tiveram acesso durante a relação de franquia durante ou após rompimento do contrato.

É certo que tais cláusulas não possuem o condão de impor limitações desmedidas sob pena de acabar incorrendo em abusividade.


Neste sentido é que a jurisprudência tem firmado o entendimento de que embora tais cláusulas sejam consideradas válidas devem respeitar os limites da razoabilidade e proporcionalidade sob pena de terem sua aplicabilidade afastada do caso concreto, exigindo do advogado especialista em franchising atenção a determinados critérios e limitações no momento de sua redação, a fim de garantir que alcance sua efetividade e não tenha sua aplicação afastada por decisões judiciais em favor do franqueado, a citar como exemplo o que já ocorreu nos seguintes precedentes:

“FRANQUIA – RESCISÃO CONTRATUAL – CONTRATO DE FRANQUIA “MINEIRO DELIVERY”. 1. ADESIVIDADE CONTRATUAL – Inaplicabilidade do CDC – Não há hipossuficiência em contratos assinados entre empresários, presumindo-se ciência e experiência daquele que assume a responsabilidade de administrar uma unidade franqueada, a par da assistência técnica e administrativa a ser prestada pela franqueadora – Precedentes do STJ. 2. NULIDADE – Entrega da COF tardiamente – Documentos indicando o cumprimento do artigo 4º, da Lei 8.955/94 – Alegação de que os recibos de entrega da COF ocorreram com data retroativa – Hipótese em que os franqueados admitem terem assinado documentos com data retroativa – Inexistência de vícios de consentimento ou coação – Validade – Precedentes deste TJSP. 3. NULIDADE – DESCUMPRIMENTO art. 3º da Lei 8.955/94 – Manifestação tardia – Hipótese em que o franqueado suscita nulidade do art. 30º da LF após transcorrido mais de ano da assinatura do contrato – Inexistência de reclamação formal anterior sobre a matéria – Convalidação tácita – Precedentes deste TJSP. 4. DESCUMPIRMENTO DO CONTRATO – AUSÊNCIA DE KNOW HOW – Inocorrência – Recebimento da COF sem reclamação formal – Assinatura do contrato regularmente – Contrato de franquia mantido por mais de um ano – Descumprimento de cláusula contratuais – Descumprimento do prazo estipulado para instalação da unidade franqueada pelos franqueados – Notificação extrajudicial concedendo prazo complementar descumprido – Descumprimento incontroverso. 5. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL – Franqueadora que não prestou com eficiência o suporte prometido – Existência de dissenso no suporte ao longo da vigência do contrato – Contribuição em parte mínima pelo insucesso do negócio – Culpa evidente – Sentença de procedência parcial mantida. 6. CLÁUSULA DE BARREIRA – NÃO CONCORRÊNCIA – VALIDADE – Pacta sunt servanda – Mitigação – Possibilidade – Abusividade – Imposição de proibição do exercício de atividade comum amplamente explorada – Abstenção apenas do uso de sinais, símbolos, cardápio ou qualquer elemento designativo igual ou semelhante aos da franqueadora, como fachada do estabelecimento, inclusive expressões que sabidamente não são de utilização universal na designação de sabores, evitando concorrência desleal. 7. CLÁUSULA PENAL – MAJORAÇÃO – Sentença que reduziu o valor da cláusula penal ( CC, art. 413)– Valor excessivo – Redução legal e adequada – Precedente do STJ – Sentença mantida. 8. SUCUMBÊNCIA – Sentença que distribui em parte iguais o ônus da sucumbência – Pretensão de imposição da sucumbência total aos franqueados em da improcedência da reconvenção – Procedência da ação principal mínima – Sentença de acerto na repartição da sucumbência mantida. 9. HONORÁRIOS RECURSAIS – MAJORAÇÃO (CPC, ART. 85, § 11)– Percentual de 10% majorado para 12% sobre a mesma base de cálculo – Recursos improvidos. Dispositivo: negaram provimento aos recursos, majorando-se a verba honorária. (TJ-SP – AC: 10174442320188260576 SP 1017444-23.2018.8.26.0576, Relator: Ricardo Negrão, Data de Julgamento: 15/06/2020, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 15/06/2020). Agravo de Instrumento contra decisão que deferiu tutela de urgência destinada a suspender os efeitos de cláusula de não concorrência avençada pelas partes em ação de rescisão de contrato de franquia. Decisão mantida, pois presentes, “in casu”, os requisitos do art. 300 do CPC para concessão da tutela de urgência, haja vista ter sido demonstrada a probabilidade do direito da autora, ora agravada, e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Cláusula de não concorrência que carece de específica limitação territorial. Referência, tão somente, aos limites territoriais para a venda/distribuição de produtos da franqueadora agravante, pela agravada, durante a execução do contrato. Inadmissibilidade de exegese extensiva da cláusula de não concorrência. A interpretação pretendida pela franqueadora resultaria na proibição ampla e genérica da atuação mercantil da agravada em todo o território nacional, ultrapassando, assim, lindes constitucionais e legais. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal no sentido de serem válidas as cláusulas contratuais de não concorrência, desde que limitadas espacial e territorialmente. As cláusulas de não concorrência têm também por escopo resguardar o “know-how”, conhecimentos e técnicas especificas empregados no negócio empresarial. A relação da franqueada com a franqueadora se limitava à compra e revenda pela agravada de produtos da franqueadora agravante, em atividade mais propriamente de distribuidora, na medida em que não se verifica a alegada transferência de “know-how” e segredo comercial ou industrial que justifique a incidência da indigitada cláusula de barreira. Decisão mantida. Agravo de instrumento desprovido.” (TJ-SP – AI: 22355114620208260000 SP 2235511-46.2020.8.26.0000, Relator: Cesar Ciampolini, Data de Julgamento: 16/12/2020, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 08/01/2021)

Da análise dos referidos julgados e de tantos outros emanados por diversos tribunais em todo país — os quais vêm se tornando cada vez mais recorrentes —, podemos destacar a importância da observação de certos requisitos para a adequada redação das cláusulas de não concorrência. E isso, a meu ver, vem como claro indicativo sobre a necessidade de maior cuidado no processo de formatação do negócio da franquia, como condição para efetividade de sua aplicação e proteção do negócio do franqueador.


Isso porque não basta que a regra de proibição à concorrência seja estabelecida em contrato mas que também possua limitação territorial, limitação temporal e limitação quanto ao ramo de atuação da franquia muito bem definidos.


No que diz respeito à limitação territorial, cláusulas de não concorrência devem ter sua imposição limitada ao território de atuação concedido ao franqueado (bairro, cidade ou Estado), não se admitindo a jurisprudência cláusulas com abrangência de território nacional.


Admitir restrição tão abrangente seria o mesmo que impor ao franqueado a mudança de país em determinadas situações, a citar como exemplo o caso dos profissionais liberais como dentistas e corretores de seguro, os quais se veriam impedidos de exercer sua profissão após saída da franquia, colocando em risco sua subsistência e de sua família.


Quanto à limitação temporal, recomenda-se a estipulação de cláusulas de não concorrência limitadas ao prazo equivalente ao prazo previsto para própria vigência do contrato, nunca superior.


Basta tomarmos os mesmos exemplos acima para entender o tamanho da abusividade uma vez que aceitar prazos maiores significaria – verdadeira sentença de morte profissional permanecendo anos a fio fora do mercado após anos de investimento em cursos e graduação para que pudessem ter uma profissão.


Por fim, tem-se como necessária a limitação de abrangência das cláusulas de não concorrência ao ramo de atuação da franquia – e neste quesito a elaboração do contrato deve se atentar a necessidade de adaptações constantes uma vez que a dinâmica do mercado muitas vezes obriga o franqueador a fazer restringir ou ampliar seu ramo de atuação.


Basta a análise de franquias que inicialmente se destacaram em um determinado ramo de atuação no início de sua expansão, como as franquias de cafeteria e chocolateria, mas que ao longo do tempo passaram a inserir em sua operação características de outros ramos – cafeterias passaram a vender refeições completas e chocolaterias passaram a integrar a venda de itens de cafeterias em sua operação – exigindo a adequação de contratos a fim de fazer abranger o ramo de atuação correto da franquia.


É comum nos depararmos com contratos de franquias com cláusulas de não concorrência que protegem apenas o ramo de atuação principal da franquia, não garantindo proteção acerca de outros ramos, produtos ou serviços que foram introduzidos na operação com o passar do tempo, ou que em virtude da inexistência de características como exclusividade e originalidade também tiveram sua efetividade prejudicada, a citarmos como exemplo, neste último caso, o seguinte precedente:

“AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE FRANQUIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECONVENÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL. DANOS MORAIS. VALOR MANTIDO. SUCUMBÊNCIA. APELAÇÃO DA RÉ NÃO PROVIDA. RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO, NA PARTE CONHECIDA. 1. Ação julgada parcialmente procedente, a fim de declarar a rescisão do contrato de franquia, afastar a cláusula de não concorrência, bem como condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais. Reconvenção improcedente. 2. Conduta da ré que ultrapassa o mero dissabor ou descumprimento contratual. Diante dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, os danos morais devem ser mantidos em R$20.000,00. 3. Transferência da carteira de clientes. Inovação recursal. Recurso não conhecido. 4. Multa por descumprimento de tutela antecipada. Decisão reformada por esta C. Câmara em razão do aditamento da inicial. Alteração do pedido. 5. O autor decaiu de parte mínima do pedido. Ônus da sucumbência que deve ser imputado integralmente à ré. Reforma. 6. Cláusula de não concorrência. Abusividade diante do disposto na COF. 7. Apelação da ré não provida. Recurso adesivo do autor parcialmente provido.” (TJ-SP – AC: 10092749220188260566 SP 1009274-92.2018.8.26.0566, Relator: Alexandre Lazzarini, Data de Julgamento: 06/09/2022, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 06/09/2022)

As cláusulas de não concorrência são ferramentas contratuais protetivas necessárias a fim de coibir práticas de concorrência desleal no mercado de franquias e somadas ao ordenamento jurídico em vigor consolidam a observância do princípio da boa-fé objetiva como norma que se impõe a todos e faz que com que não restem dúvidas quanto a sua aplicação e efetividade da Justiça.


Contudo, ainda há muito o que se buscar em termos de conscientização dos franqueadores quanto à importância de adequada formatação e à constante atualização dos jurídicos, com vistas à proteção do negócio e à manutenção da integridade da própria rede, bem como de investidores e franqueados, uma vez que o conhecimento e o aprofundamento sobre o tema também pode ajudar a prevenir eventual imposição de cláusulas abusivas.


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